domingo, outubro 01, 2006

Porque é que não há perguntas estúpidas?

Há uns tempos uma jornalista da RTP perguntou a José Saramago aquilo que muitos portugueses também se perguntaram na altura - como comentava a contradição entre o voto em branco e a sua candidatura ao Parlamento Europeu- ao que o nobel respondeu: "a senhora só faz perguntas estúpidas". Nem pareceu resposta de Nobel! Também há uns tempos o Sr. presidente do Futebol Clube do Porto, perante uma pergunta, à epoca, actual (relacionada com o facto do presidente da Câmara do Porto estar ou não a seu lado), reagiu assim: "essa é uma pergunta estúpida". Pois eu, sou um bocado sensível a estas coisas das perguntas estúpidas. Porque acho que não existem propriamente perguntas ditas estúpidas. O que acho que existe, sim, são perguntas inúteis, e isso é muito diferente de perguntas estúpidas! Estas últimas não são senão aquelas perguntas que aos olhos do interlocutor têm uma resposta implícita, e por isso lhe parece desnecessária. Exemplificando, alguém esta à nossa frente e pergunta-nos: Tás ai ? (e nos temos vontade de responder: não, estou ali, o que estas a ver é uma miragem...) ou então a nossa chefe na redação pergunta: Vieste trabalhar? (não, é a minha irmã gémea...) ou então a tia que nao vemos ha anos pergunta: Tás mais velha, ou é impressão minha?(não, com a idade fiquei mais nova...) ou finalmente, quando saimos de casa de bikini e levavamos com a nossa mãe a perguntar: vais à praia??? (claro que não, mamã, vou fazer alpinismo!). É verdade, que há perguntas ingénuas, perguntas preguiçosas, perguntas enfadonhas, perguntas mal formuladas, perguntas feitas sem pensar. Mas todas elas, mesmo as mais inúteis, representam uma vontade de compreender melhor o mundo, alguma coisa, alguma situação, alguém... Ou servem simplesmente como complemento, confirmação ou preocupação. Daí que não haja perguntas estúpidas. Já na Antiguidade, dizia Sócrates, o filósofo da ironia (ironia que em grego significa interrogação), que a sabedoria começa pelo reconhecimento da própria ignorância, "eu sei que nada sei". Daí que perguntar, à minima dúvida ou para o mais curto esclarecimento, seja fundamental. Mesmo que nos tenhamos de sujeitar ao PÉSSIMO génio dos interrogados.

"E assim continuamos a perguntar e a perguntar
Até que uma mão-cheia de terra
Faça calar as nossas bocas ―
Mas será isso uma resposta?"

HEINRICH HEINE, "Lazarus" (1854)

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